Resumo: Artigo 36264
O Diálogo Bohr e Wheeler-Everett sobre fundamentos da quântica e relações de poder na ciência. (60, 66, 67)
Fabio Freitas, Universidade Estadual de Feira de Santana, BrazilOlival Freire Jr., Universidade Federal da Bahia, Brazil.
Apresentação: Wednesday, May 29, 2008 3:45PM - 5:45PM sala 201 - UNIRIO VII ESOCITE - Sessão 21 - Chair: Flavio Edler
Abstract.
A mecânica quântica se tornou um dos mais fascinantes temas da ciência contemporânea fora dos círculos acadêmicos por dois motivos: o primeiro é o impressionante desenvolvimento tecnológico que ela permitiu e, com isso, o grande impacto que teve na vida da sociedade e das pessoas; o segundo motivo é a permanente "revolução" filosófica que a acompanha, fruto de uma contínua insatisfação com as possíveis lições que seus fundamentos lançam para a nossa compreensão de seu significado. Esse segundo tema, fruto de nossas pesquisas, é um dos episódios mais frutíferos para se compreender a dinâmica da prática científica e relações sociais dentro da mesma durante o século XX. A mecânica quântica foi fundada formalmente entre 1925 e 27, porém o significado de seu formalismo e a imagem de mundo subjacente nunca vieram a se tornar uma unanimidade. Efetivamente, a literatura histórica separa em três períodos a controvérsia relativa aos fundamentos da teoria quântica. O primeiro período, conhecido por monocracia de Copenhague, configura o intervalo entre suas origens e o início da década de 1950, durante o qual a interpretação de Copenhague, desenvolvida por Niels Bohr e seus colaboradores, se tornou dominante entre os físicos, e somente poucos eram os dissidentes, entre eles incluídos Albert Einstein e Erwin Schrödinger. O terceiro período, que se inicia na década de 1970 e permanece até hoje, descreve a situação de uma controvérsia institucionalizada, na qual esses temas de fundamentos da quântica são aceitos como parte da Física de "mainstream" e periódicos especializados garantem a circulação de suas pesquisas. O segundo período, no qual tomaremos um estudo de caso como objeto deste trabalho, ficou conhecido como um período de transição, quando a monocracia de Copenhague começou a ruir e novas tentativas de se interpretar a mecânica quântica foram se desenvolvendo, mas não sem grande resistência da comunidade de físicos. Durante esse período de transição, um jovem estudante de doutorado em Princeton, Hugh Everett III, sob a orientação de John Wheeler, desenvolveu a interpretação dos estados relativos, hoje conhecida por interpretação dos muitos mundos e que teve dedicada nos seus 50 anos, em julho de 2007, a capa e o editorial da "Nature". Porém essa interpretação, quando de seu desenvolvimento, não despertou grande interesse na comunidade científica. Mais do que isso, essa interpretação que parecia trazer contribuições originais sobre a natureza do domínio quântico sofreu um duro golpe quando Wheeler resolveu levá-la para debater com Niels Bohr. O objetivo de Wheeler era conseguir o aval de Bohr e publicá-la na academia de ciências da Dinamarca, porém a recepção por parte de Bohr e dos colaboradores de Copenhague foi extremamente negativa. Estes não reconheciam os problemas que Everett objetivava resolver e consideravam que a sua própria interpretação dava conta de todos os problemas, fechando o caminho para novas interpretações. Neste trabalho nós vamos examinar de que modo as relações de poder no campo da física influenciaram a carreira do jovem Everett e de sua interpretação. Everett abandonou a pesquisa em Física, indo trabalhar no Pentágono, e sua interpretação permaneceu esquecida por muito tempo. Em especial, vamos focar no papel que Bohr detinha na comunidade de físicos, tanto pelo seu carisma como por sua autoridade intelectual e institucional. Nessa análise vamos nos apoiar nas noções de Bourdieu de campo científico, onde as posições dos protagonistas expressam correlações de força dentro do campo de pesquisa.